Merecidamente as incorporadoras imobiliárias estão entre as empresas mais populares do nosso portal.  Iniciaram a retomada em 2018 e tiveram um ano magnífico em 2019.  Não fosse o coronavirus, o setor em 2020 iria dar muitas alegrias aos acionistas graças à combinação de juros baixos e declinantes, renda&emprego em alta, credito farto, economia crescendo e otimismo generalizado.  

Esse cenário ficou no passado.  Mas mesmo com tantas incertezas pela frente, os investidores precisam de informações que aumentem as chances de se tomar decisões certas.  O problema é que, nos dias de hoje, há poucas informações úteis que podemos extrair dos balanços e das apresentações das empresas listadas.  No post “Coronavírus: Como fica a utilidade dos números até 4T19?” abordo este tema. 

Clientes minha empresa de consultoria empresarial e financeira tem me procurado para obter ajuda no gerenciamento de riscos nesse cenário novo e desconhecido.  Além da queda de receitas, o crédito, principalmente bancário, vem se comportando como os respiradores mecânicos:  escasseando e ficando muito caro.  O risco de crédito irá aumentar para quem toma e para quem concede, sejam bancos, fornecedores, clientes e parceiros. 

“Cash is king”! Essa é a máxima sempre repetida com ou sem crise.  Nos imprevisíveis próximos meses as forças mais importantes para enfrentar a crise são, na ordem de importância, uma gorda reserva de caixa, compromissos financeiros mais longos possível e alto nível de capitalização para diminuir a dependência de recursos de terceiros.

Para entender como estão a situação de liquidez e a dependência de capitais de terceiros das incorporadoras que acompanhamos, montamos a tabela abaixo com os dados contábeis de 8 empresas, auditados, de 31-Dez-19.  São os mais recentes disponíveis. 

Desde então os balanços evidentemente mudaram.  Mesmo assim é possível extrair alguma informação útil e estimar, sob os aspectos de liquidez e de capitalização, as condições dessas empresas para lidar com a crise.

Por que liquidez e capitalização ?  Porque nas próximas semanas ou meses, as empresas que não precisarem desesperadamente de caixa terão maiores chances de sobrevivência.  É claro que capacidade operacional, marca, market share e outras coisas assim são importantes.  Mas no curto e médio prazo, dado o cenário de paralisação quase total da economia, ter caixa é o que realmente importa.

Vamos analisar os dados percentuais pois não estamos comparando tamanho do balanço mas qualidade.  Olhando uma empresa isoladamente, os percentuais nos dão uma ideia da liquidez e da capitalização dela.  Entre empresas, a comparação entre os percentuais e estes com a mediana, informa se a empresa está muito acima ou abaixo dos padrões da amostra e portanto de seus pares.  A mediana é melhor que a média porque é menos influenciada pelos casos extremos.

A linha 3 mostra a proporção de caixa comparada ao Ativo Total.  Com a redução das taxas de juros o custo de carregamento deste “seguro de liquidez” ficou menor viabilizando a manutenção de balanços mais líquidos.

A linha 7 traz a proporção da Divida Financeira Bruta (Empréstimos CP + LP) sobre o Ativo Total.  Mostra o volume de recursos que foi obtido do mercado financeiro, depois da empresa se fundear com os acionistas, com clientes, com fornecedores, com o governo (impostos a pagar), etc. Quanto menor esse percentual, menos risco de refinanciamento. A mediana de 28,4% aponta uma vulnerabilidade relativamente baixa.

A linha 8 não é um percentual mas traz uma informação que vale registrar.  Das 8 empresas, 6 dispunham de caixa suficiente para pagar 100% da Dívida Financeira de CP e ainda sobraria dinheiro, que são os valores em vermelho. Isso é muito bom pois alivia a pressão sobre as empresas nos primeiros meses da crise.  É muito melhor ter caixa em mãos para negociar com clientes, credores e parceiros.

A linha 10 traz a proporção da Dívida Financeira Líquida (Dívida Bruta – Caixa) sobre o Ativo Total.  É uma medida de resiliência (ou de vulnerabilidade) mais aguda e precisa.  O grupo traz uma mediana de 12,4%, um bom índice.

A linha 11 compara a Dívida Financeira Líquida ao Patrimônio Líquido.  É uma das maneiras de se avaliar a capitalização das empresas.  A mediana de 35,3% diz que para cada R$ 1,00 de capital dos acionistas as empresas tomaram, em termos líquidos,  R$ 0,35 dos bancos para financiar a sua atividade.  Uma dependência de bancos administrável.

A linha 13 é o índice mais usado para medir a capitalização de empresas.  Ele informa quanto da atividade total os acionistas financiaram.  O índice considerado “bom” varia muito de acordo com o setor econômico.  Mas como regra geral, balanço seguro é aquele com pelo menos 33% do Ativo Total fundeado pelo Patrimônio Líquido.  Percentuais acima de 33% não só mitigam o risco e o custo de obtenção de financiamento de 3ºs como também mostra o comprometimento dos acionistas com o negócio.  A mediana de 42,6% aponta que a maioria das empresas tem boa capitalização.

Finalmente a linha 14, que não é um percentual mas o Índice de Liquidez Corrente (divisão de Ativo Circulante pelo Passivo Circulante) mostra a cobertura dos Ativos de Curto Prazo sobre ao Ativos de Curto Prazo.  Em termos de solvência este índice deve ser, pelo menos, maior que 1,0.  Sendo 1,0 indica que numa situação hipotética de se realizar (monetizar) todos os Ativos de Curto Prazo, seria possível liquidar todos os Passivos de Curto Prazo.  Mas isso não é bastante.  É preciso que seja maior que 1,0 pois a empresa conseguiria suportar eventuais inadimplências dos recebíveis ou outras frustrações na monetização dos ativos.  A tabela mostra uma forte indicação da segurança da solvência dos balanços.  A mediana de 2,4 é um índice bastante bom porque embute uma reserva de liquidez para mitigar problemas.

Entre os 8 nomes há 2 empresas que estão nos extremos. Para cada uma fizemos um post específico no nosso portal que podem ser consultados para mais detalhes.  A Rossi vem de um árduo processo de recuperação.  Ela fechou um acordo com o seu principal banco para quitar uma dívida substancial com desconto e vai pagar com ativos imobiliários.  Se realizado conforme negociado, terá um forte impacto positivo para a empresa.  Do outro lado temos a Trisul com um perfil invejável de liquidez (não tinha dívida em termos líquidos) e de capitalização. 

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NÃO SE TRATA DE RECOMENDAÇÃO DE COMPRA OU VENDA

Sobre o Autor: Claudio R. Cusin é Engenheiro Mecânico formado pela Poli (USP) e Economista formado pela FEA (USP). É consultor de finanças e trabalhou no mercado financeiro por 30 anos.  Foi Diretor de Credito e de Risco em vários bancos de investimento e comerciais.     Email: [email protected]

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